segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Célula: unidade da vida

  A invenção do microscópio e a descoberta da célula 

É difícil dizer quem inventou o aparelho hoje conhecido como microscópio (do grego mikros = pequeno; skopeo = examinar). Um dos candidatos a essa invenção foi o cientista Galileu Galilei (1564-1642), em 1609. Mas quem chamou a atenção dos cientistas para o uso desse aparelho no estudo de microrganismos foi um comerciante de tecidos holandês. 

A descoberta da célula 

O holandês Anton van Leeuwenhoek (1632-1723; pronuncia-se “lêvenhuk”) foi um comerciante de tecidos que dedicava boa parte do seu tempo ao estudo da natureza. Ele tinha notável habilidade para polir lentes e torná-las muito finas, para poder usá-las para examinar as fibras de tecidos e atestar sua qualidade. Com suas lentes e técnicas de iluminação, Leeuwenhoek foi capaz de aumentar a imagem dos objetos até 270 vezes. Ele pôde, assim, observar microrganismos que mediam apenas cerca de 0,003 mm de comprimento. Embora as imagens fossem ainda muito distorcidas na forma e na cor, isso já constituía um grande avanço, pois o ser humano não enxerga, a olho nu, objetos com menos de aproximadamente 0,1 mm de comprimento.



Na mesma época em que Leeuwenhoek desenvolvia suas lentes e realizava suas observações de um mundo pequeno demais para ser observado a olho nu, o cientista inglês Robert Hooke (1635-1703; pronuncia-se “huk”, com a letra “h” aspirada) observou pedaços de cortiça com o auxílio de um microscópio formado por duas ou mais lentes associadas dentro de um tubo de metal. Esse objeto era o chamado microscópio composto, semelhante aos microscópios de hoje. Hooke descreveu pequenas cavidades no interior daqueles pedaços de cortiça e deu-lhes o nome de células (do latim cellula 5 pequeno compartimento). De fato, como a cortiça é um tecido de células mortas que protege o tronco das árvores, o que Hooke viu foi apenas o envoltório da célula e o espaço vazio antes ocupado pela célula viva.


Microscópio utilizado por Hooke e ilustração, feita por ele, de um pedaço de cortiça observado com o instrumento (o corpo do microscópio tinha cerca de 15 centímetros de comprimento). 

A construção do conhecimento humano sobre as células continua até hoje. Depois de Hooke, na década de 1820, o botânico escocês Robert Brown (1773-1858; pronuncia-se “bráun”) descobriu um pequeno corpo no interior de vários tipos de células e o chamou de núcleo. 

Já em 1838, o botânico alemão Matthias Schleiden (1804-1881; pronuncia-se “xláiden”) concluiu que a célula era a unidade básica de todas as plantas. Um ano mais tarde, o zoólogo alemão Theodor Schwann (1810- -1882; pronuncia-se “xvan”) generalizou esse conceito para os animais. Iniciava-se assim o desenvolvimento da teoria celular de Schwann e Schleiden. Essa teoria afirma, entre outras generalizações, que todos os seres vivos são formados por células.

 Theodor Schwann. Ele estende o conceito de Schleiden e afirma que a célula é a unidade básica de todos os animais.

Mas ainda havia uma questão: de onde vinham as células? Em 1858, o médico alemão Rudolf Virchow (1821-1902; pronuncia-se “fírchov”) afirmou que toda célula provém de outra, querendo dizer que uma célula é capaz de se reproduzir. Virchow fez mais uma afirmação ousada para a época: as doenças seriam consequência de problemas nas células.

A teoria celular 

Com base nessas e em outras descobertas, elaborou-se a teoria celular. Como vimos, a elaboração dessa teoria foi resultado de várias pesquisas realizadas por diversos cientistas ao longo do tempo. De acordo com essa teoria, todos os seres vivos são formados por células. Alguns têm o corpo formado por uma única célula. Portanto, a célula é a unidade morfológica dos seres vivos. A teoria celular também parte do princípio de que a célula é a menor unidade viva. As propriedades vitais de um organismo dependem das propriedades de suas células, nas quais ocorrem as reações do metabolismo. Portanto, a célula é a unidade fisiológica dos seres vivos. Por fim, essa teoria defende que as células surgem sempre de outras células. E que cada uma contém as informações hereditárias de todo o organismo.

Uma célula animal típica mede entre 10 µm e 20 µm de diâmetro: ela é cerca de cinco vezes menor que a menor partícula visível a olho nu.

O estudo da Célula 

Para estudar a estrutura e o funcionamento da célula, os cientistas utilizam vários instrumentos e técnicas. Um exemplo de instrumento é o microscópio. O material analisado nesse equipamento é geralmente tratado com corantes e fixadores para que se possa melhorar a visualização das estruturas microscópicas. 

Microscópio, corantes e fixadores 

Se dois pontos estiverem separados por uma distância igual ou superior a 0,1 mm, seremos capazes de distingui-los a olho nu. Se a distância for menor que 0,1 mm, veremos apenas um ponto; a imagem perde nitidez. Isso significa que o olho humano tem poder de resolução de 0,1 mm. Esse é o diâmetro aproximado do óvulo humano. Para ver algo menor, precisamos da ajuda de um microscópio. O microscópio de luz ou óptico é formado por um sistema de lentes com poder de resolução de até 0,2 µm, bem maior que o do olho humano. Com esse instrumento podemos aumentar a imagem de um objeto cerca de 1 500 vezes sem que ela perca nitidez. O aumento do tamanho da imagem no microscópio de luz resulta de um sistema de lentes chamadas lentes convergentes, estudadas em Física. 

Com esse aumento obtido pelo microscópio é possível ver as células e algumas de suas estruturas internas. As fotos tiradas com microscópios são chamadas micrografias.





            Entenda melhor o funcionamento do microscópio.O microscópio de luz é um conjunto formado, entre outros componentes, por duas lentes (objetiva e ocular); parafusos macro e micrométrico (este com maior precisão) para ajustar o foco da imagem; fonte de luz e condensador para projetar um feixe de luz sobre o objeto; platina, que sustenta a lâmina de vidro na qual está o objeto; parte mecânica de suporte. O aumento da imagem é obtido pela multiplicação do aumento da objetiva pelo aumento da ocular.

Um objeto que se queira observar com esse aparelho precisa ser atravessado por um feixe de luz, portanto, é preciso que ele seja suficientemente fino. Em observações mais grosseiras, um corte fino do objeto pode ser obtido com uma lâmina de barbear. Em observações mais cuidadosas, o corte deve ser feito com um aparelho especial, o micrótomo. Nesse caso, o objeto, comumente um tecido animal ou vegetal, deve ser colocado em blocos de parafina para facilitar o corte, processo conhecido como inclusão. A maioria das estruturas celulares, no entanto, só pode ser vista ao microscópio comum se a célula for previamente tratada com corantes. Cada corante reage apenas com determinadas estruturas da célula, fornecendo um contraste que facilita sua observação . No caso de observações demoradas e repetidas, usam-se fixadores (álcool e formol, por exemplo), substâncias que conservam a célula, alterando o mínimo possível sua estrutura. 

A Citologia ganhou impulso muito grande com a invenção do microscópio eletrônico de transmissão, em 1939. Nesse microscópio, em vez de lentes de cristal, há bobinas que funcionam como eletroímãs desviando o feixe de elétrons (fenômeno estudado em Eletromagnetismo, um ramo da Física). A imagem pode ser observada em uma tela ou em uma micrografia. Com essa técnica, pode-se alcançar um poder de resolução de até 0,0014 µm. A utilização desse tipo de microscópio e de outras técnicas sofisticadas permite obter informações mais detalhadas sobre a estrutura e a composição química da célula, além de seus processos metabólicos. 

Mais tarde foi desenvolvido o microscópio eletrônico de varredura , no qual um feixe de elétrons, em vez de atravessar o objeto, varre-o como se fosse uma pessoa sentindo com os dedos o relevo de uma superfície. Desse modo, consegue-se uma imagem tridimensional do objeto. Essa imagem é formada por elétrons refletidos, e não por elétrons que atravessam o material.



Células Procariotas e Eucariotas 

Compare o esquema de uma bactéria com o de uma célula animal ou vegetal. É possível perceber que a bactéria é formada por uma célula bem mais simples que a animal e a vegetal.




 A célula da bactéria é uma célula procariota ou procariótica (do prefixo português pro= anterior; e do grego karyon = núcleo; onthos - ser): o material genético (DNA) não está envolvido por uma membrana e não há um núcleo individualizado e separado do citoplasma; o DNA está mergulhado em uma espécie de gelatina, formada por água e várias substâncias dissolvidas. No citoplasma encontramos também os ribossomos, organelas responsáveis pela síntese de proteínas. Todo esse conjunto é envolvido pela membrana plasmática, formada por lipídios e proteínas. Envolvendo essa membrana, existe ainda um reforço externo, a parede celular, composta de cadeias de glicídios e aminoácidos. Os seres vivos formados por células procarióticas são chamados procariontes. Eles são organismos unicelulares, medindo, em geral, entre 1 µm e 10 µm de tamanho, e são representados pelas bactérias. Na classificação moderna, consideramos bactérias também as algas cianofíceas ou azuis, atualmente chamadas cianobactérias. A célula eucariota ou eucariótica (do grego eu = bem, verdadeiro; karyon = núcleo), medindo entre 10 µm e 100 µm de tamanho, é bem maior e mais complexa que a procariótica. Seu material genético é constituído por DNA associado a proteínas – formando os cromossomos – e está envolvido por uma membrana, o envelope nuclear (também chamado carioteca). Forma-se, assim, um núcleo individualizado. Os organismos uni ou pluricelulares formados por células eucarióticas são chamados eucariontes. No citoplasma dos eucariontes existe, além dos ribossomos, uma série de organelas, envolvidas por uma membrana, que estão ausentes nos procariontes: mitocôndrias, retículo endoplasmático, complexo golgiense (antes chamado complexo de Golgi), cloroplastos, lisossomos, etc..

A evolução da estrutura da célula 

A célula eucariótica deve ter surgido da procariótica por dois processos: 

• invaginações da membrana formaram canais e vesículas e originaram várias estruturas, como o envelope nuclear, o retículo endoplasmático, o complexo golgiense e outras, que serão estudadas adiante;

 • bactérias invadiram as células primitivas e passaram a viver em seu interior, formando outras organelas, como a mitocôndria e o cloroplasto.

Surgiu, assim, uma célula dividida em compartimentos. Cada um deles passou a desempenhar uma função definida. Essa divisão de trabalho permitiu que cada função fosse realizada com eficiência, propiciando o aparecimento de células maiores e também de seres vivos maiores, pluricelulares, que consomem mais alimento e energia e dependem de sistemas mais eficientes para essas funções. 

O caso dos vírus 

Você certamente já teve alguma doença causada por vírus (do latim virus 5 veneno). Algumas viroses comuns são gripe, sarampo, herpes, hepatite, resfriado, dengue, catapora, caxumba, rubéola e febre amarela, entre outras. Entender os vírus que causam doenças é uma das razões pelas quais seu estudo é fundamental. Os vírus prejudicam pessoas, plantas e animais e devem ser estudados também por profissionais interessados em combater doenças em criações e plantações, por exemplo. Além disso, os vírus são interessantes porque são diferentes de todos os outros organismos, sejam procariontes, sejam eucariontes. Sua organização é muito simples: cápsulas de proteína (às vezes há outras substâncias, como lipídios e glicídios) com material genético (DNA ou RNA) em seu interior. Os vírus são capazes de se reproduzir somente quando estão no interior de uma célula.Os novos vírus formados são semelhantes ao original, caracterizando, portanto, propriedades de reprodução e hereditariedade. Como também são capazes de sofrer mutações no ácido nucleico, eles podem evoluir. Dessa forma, quando estão no interior de células vivas, os vírus apresentam certas propriedades de seres vivos. Fora delas, no entanto, não possuem essas propriedades e permanecem inertes. Por isso dizemos que eles são parasitas intracelulares obrigatórios. Talvez os vírus tenham se originado de fragmentos de ácidos nucleicos que escaparam de algumas células e penetraram em outras. Eles não pertencem a nenhum dos cinco reinos ou dos três domínios e, para muitos cientistas, não são considerados seres vivos. De acordo com esses cientistas, os vírus seriam apenas agentes patogênicos, ou seja, causadores de doenças. Segundo essa visão, os vírus não seriam vivos porque não apresentam metabolismo próprio, dependendo do metabolismo de células de outros seres. Outros cientistas consideram que a capacidade de replicação, a hereditariedade e a evolução já são suficientes para considerar os vírus seres vivos. Ou seja, para conseguir definir se os vírus são seres vivos ou não, é necessário compreender o que é a vida. Embora pareça simples observar no ambiente onde há e onde não há vida, os vírus parecem ser uma forma limítrofe difícil de se encaixar em definições simples. Por isso essa discussão ultrapassa o campo da Biologia e intriga estudiosos de diversas áreas, como a Filosofia.

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terça-feira, 6 de junho de 2023

Fermentação

Quando falamos em fermentação, o que te vem à cabeça? Primeiramente, vem a cerveja, certo? Muita gente não sabe, mas diversos outros alimentos e bebidas do nosso dia a dia também são fermentados. Você sabe quais são esses alimentos?

Mas, afinal, o que é a fermentação? Ela consiste em um processo bioquímico realizado por microrganismos, como bactérias e leveduras, para a obtenção de energia. Além da produção de alimentos, o processo de fermentação também é utilizado na produção de medicamentos e biocombustíveis. Esse é um processo de importância fundamental para a manutenção da vida no planeta.

Para além de gerações antepassadas recentes, os alimentos e bebidas fermentados acompanham desde o início da civilização, mesmo antes de se compreender que os microrganismos eram os responsáveis pela fermentação, tendo um papel importante nas sociedades emergentes. As bebidas fermentadas forneciam não apenas nutrição, mas eram basicamente as únicas fontes de líquidos limpos, não contaminados e, portanto, de valor medicinal. No passado, o processo de transformar matérias-primas em alimentos nutritivos e saborosos era considerado algo divino e mágico.
O café, o chocolate, o chucrute, a kombucha, o pão, o iogurte, o vinho, a sidra, são todos produtos fermentados. Quando fermentamos nossos alimentos e bebidas, resgatamos a cultura dos nossos antepassados. E, quando adquirimos produtos fermentados de produtores locais, é como se fizéssemos parte de uma grande revolução, onde temos como aliado um exército de seres microscópicos.

Tipos de fermentação
Existem diversos tipos de fermentação, mas as mais importantes, quando falamos de alimentos e bebidas, são a fermentação alcoólica, acética e lática. Vamos saber um pouco mais sobre cada um desses tipos de fermentação?

Fermentação alcoólica

A fermentação alcoólica ocorre em algumas bactérias e leveduras, entre elas a Saccharomyces cerevisae, amplamente utilizada na produção de bebidas alcoólicas e na panificação.

A fermentação alcoólica é um processo biológico, no qual açúcares, como a glicose, frutose e sacarose, são convertidos em energia celular com produção de etanol e dióxido de carbono como resíduos metabólicos.

Como este processo pode ser realizado sem a presença de oxigênio, é considerado um processo anaeróbico. Além do pão, esse tipo de fermentação ocorre em bebidas, como vinho, sidra, cerveja e kombucha.

Fermentação lática

A fermentação lática é realizada geralmente por bactérias do gênero Lactobacillus, mas também pode ser realizada por algumas leveduras, como a Lachancea Fermentati.

Ocorre quando a etapa da glicólise tem como carboidratos a glicose ou galactose, obtidas a partir da quebra de uma molécula de lactose. Além disso, essa fermentação é muito comum na produção dos iogurtes e queijos.

Fermentação acética

A fermentação acética ocorre quando o etanol, obtido a partir da fermentação alcoólica, entra em contato com bactérias acéticas, como a Acetobacter e Gluconobacter. Essas bactérias transformam o etanol em moléculas de ácido acético por meio de um processo de oxidação. Além disso, o ácido acético é o principal componente do vinagre e aparece em outros alimentos e bebidas, como a kombucha e alguns estilos de cerveja.

Fermentação de cerveja: especificidades do líquido sagrado

A fermentação é uma das etapas mais importantes do processo de produção de cervejas e uma das fases que mais demandam cuidados.

Nessa etapa, as leveduras transformam os açúcares do mosto, extraídos do malte, em álcool e gás carbônico. O processo de fermentação também é responsável por formar diversos aromas e sabores das cervejas. Além disso, nessa etapa é que as leveduras reabsorvem e eliminam alguns compostos indesejáveis.

Quando falamos de fermentação, é inevitável falar de levedura, uma das principais matérias-primas da cerveja. Na fermentação da cerveja, a levedura, um microrganismo unicelular, é a protagonista que possui capacidade de realizar a transformação dos açúcares e outros nutrientes em cerveja.

Um pouco da história da fermentação

No passado, por muito tempo, a fermentação alcoólica, que é o processo que origina a cerveja, foi considerada divina e mágica. Posteriormente, a fermentação alcoólica foi explicada como uma reação química espontânea promovida pelo contato com o ar, onde a levedura era considerada um mero subproduto. Foi somente com os estudos de Louis Pasteur, em meados de 1800, que concluiu-se que as leveduras estavam diretamente envolvidas na fermentação.

Tipos de fermentação na cerveja

Na cerveja, são geralmente abordados cinco tipos de fermentação, a partir do tipo de leveduras utilizadas. São as fermentações ale, lager, híbridas, mistas e espontâneas.

Fermentação Ale
As cervejas ale são produzidas por leveduras que trabalham em temperaturas mais elevadas (de 18° a 25°C) e, em geral, possuem aromas e sabores mais intensos e variados, uma vez que essa temperatura mais elevada, durante a fermentação, resulta na formação de compostos, como ésteres, que podem conferir aromas frutados à bebida.

Fermentação Lager
Por outro lado, as cervejas da família lager são produzidas com leveduras que costumam fermentar em temperaturas mais baixas, produzindo cervejas com uma característica de aroma e sabor mais limpo, sem muitos compostos derivados da fermentação.

Fermentação Híbrida
No caso da fermentação híbrida, ela ocorre quando duas ou mais cepas de leveduras ou o processo de ale e lager se mistura na mesma cerveja. Um exemplo de cerveja de fermentação híbrida é a California Common, um estilo que utiliza leveduras lager, que normalmente fermentam em temperaturas mais baixas (entre 9°C e 15°C) e fermentam em temperaturas mais altas, como uma Ale.

Fermentação Mista
Por fim, outro tipo de fermentação de cerveja é a fermentação mista. O processo ocorre quando há mais de uma fermentação acontecendo, como, por exemplo, a alcoólica e a lática. Geralmente ocorre quando são inoculadas leveduras e bactérias para a produção de estilos específicos, como as Catharinas Sours.

Fermentação Espontânea
A fermentação espontânea também pode ser considerada mista, mas nenhum microrganismo é adicionado ao mosto. Nesse caso, a fermentação ocorre por meio de leveduras e bactérias selvagens, que podem ser captadas a partir de frutas e cascas de árvores, do próprio malte ou do próprio ambiente em que a cerveja está sendo fermentada, como por exemplo, do próprio ar, como ocorre com as cervejas Lambics. Geralmente, após fermentar, esse tipo de cerveja é armazenada por meses em tonéis de madeira. Ou seja, essas cervejas não adquirem suas leveduras e bactérias somente do ar externo, mas também da própria microflora criada nos equipamentos da cervejaria.
Nas fermentações espontâneas, também conhecidas como naturais ou selvagens, o processo ocorre em ambientes abertos. As bactérias e algumas leveduras presentes convertem o etanol em ácido acético, produzindo o sabor e aroma azedo. Os microrganismos também irão produzir ácidos orgânicos e outros metabólitos a partir da degradação dos carboidratos presentes. 

Embora, atualmente, há a possibilidade de utilizar culturas isoladas puras de bactérias e leveduras e controlar a produção de componentes indesejáveis através do monitoramento de alguns parâmetros físico-químicos, na fermentação natural, outros fatores, como a matéria-prima e o ambiente, são influenciadores das características organolépticas, que estão além do controle. Isso reflete na dificuldade de padronizar esses produtos, mas também traz uma camada de sabores e aromas complexos e especiais.

Fermentação de cerveja: fases do processo
Do ponto de vista biológico, podemos dividir o processo fermentativo habitual da cerveja em três fases:

1. Adaptativa

2. Exponencial

3. Estacionária

1. Fase adaptativa
Inicialmente, no mosto cervejeiro, as leveduras vão passar por um período de adaptação no ambiente, chamado de fase lag, e vão então iniciar o ciclo celular, para criar novas células de levedura. Nessa fase, o controle da temperatura da fermentação é muito importante, pois temperaturas mais altas vão resultar em mais células de levedura, e esse crescimento mais rápido pode resultar em compostos de aroma indesejáveis nas cervejas, e temperaturas muito baixas podem retardar a fermentação.

2. Fase exponencial
Durante a fase exponencial, a levedura busca uma maneira de conseguir energia para se multiplicar no mosto de cerveja, utilizando, para isso, as reservas de glicogênio que possui em sua própria célula e o oxigênio disponível no mosto para promover a formação de ergosterol, um componente essencial para sua membrana celular. Assim, ela vai ficar “forte”, para permitir o brotamento de novas células de levedura que vão auxiliar na fermentação saudável da cerveja. Durante essa fase, a população de leveduras aumenta rapidamente e converte os açúcares do mosto em álcool.
Durante a fermentação alcoólica, a levedura vai degradar os carboidratos presentes no mosto cervejeiro, produzindo etanol, gás carbônico e diversos compostos como ésteres, álcoois superiores e compostos sulfurados que, mesmo em quantidades pequenas, vão ter uma enorme influência no sabor e aroma do produto final. Em determinadas quantidades, inclusive, esses compostos podem ocasionar graves defeitos sensoriais nas cervejas.

3. Fase estacionária
Por fim, durante a fase estacionária, o crescimento da população cessa, a atividade fermentativa diminui, e as leveduras reabsorvem grande parte dos compostos de aroma indesejáveis, amadurecendo e equilibrando o aroma da cerveja. Nessa fase, é observado que a fermentação está em baixa atividade, verificando a medida da gravidade final da cerveja e determinando que ela está pronta para passar para as etapas de maturação e envase.